20 anos de Lei 10.639/03: O ensino da história e cultura afro-brasileira e africana

ARTIGO

20 anos de Lei 10.639/03: O ensino da história e cultura afro-brasileira e africana

No dia 9 de janeiro de 2023 a Lei 10.639, que estabelece o ensino de história e cultura afro-brasileira e africana na educação básica, completou 20 anos. Sancionada em 2003, no primeiro mandato do presidente Lula, a lei ainda foi implementada em 2008, quando passou a abranger também a obrigatoriedade sobre povos e culturas indígenas no nível médio da educação básica.

A partir daquele momento, passou a ser necessário não apenas formar professores capacitados para abordar esses temas. Foi preciso também adaptar o material didático existente e enfrentar eventuais resistências, que ainda persistem, manifestadas especialmente pela intolerância religiosa e pela discriminação em relação aos saberes e conhecimentos de povos africanos e afro-brasileiros.

O impacto positivo que essa lei exerceu e exerce na vida de milhares de crianças, jovens e adultos negros é muito grande. Pela primeira vez, os negros deveriam ser apresentados como um agente histórico fundamental para a cultura nacional, sendo eles responsáveis também pelo fim da escravidão, questionando, assim, a ideia de uma aristrocrata (princesa Isabel) como a responsável, a redentora, do fim da escravidão.

Apesar dos grandes avanços que essa lei trouxe para o ensino de história, ainda há alguns outros pontos que precisam de atenção especial para que haja uma completa efetivação desse dispositivo legal antirracista. Não basta que o Ministério da educação, as Secretarias estaduais e municipais e as escolas (em todos os níveis) lembrem de fazer valer esta lei apenas no dia 20 de novembro. É preciso que todos os órgãos de educação fomentem uma campanha continuada para que uma educação antirracista consiga cimentar suas bases. Só assim poderemos rumar a uma educação que seja libertadora e democrática, assim como sonhava o mestre Paulo Freire.

É preciso que haja uma formação continuada com todos os professores, de todas as matérias, para que busquem em suas práticas pedagógicas trazer intelectuais negros e negras, não ficando restrito apenas a professores de História. Uma educação antirracista é possível, desde que as condições oferecidas pelo Estado brasileiro sejam adequadas e que lutemos por uma outra sociedade livre do racismo e de qualquer outro tipo de opressão.

E a Lei 10.639/03 chegou para isso, pois ela propõe novas diretrizes curriculares para o estudo da história e cultura afro-brasileira e africana. Por exemplo, os professores devem ressaltar em sala de aula a cultura afro-brasileira como constituinte e formadora da sociedade brasileira, na qual os negros são considerados como sujeitos históricos, valorizando-se, portanto, o pensamento e as ideias de importantes intelectuais negros brasileiros, a cultura (música, culinária, dança) e as religiões de matrizes africanas.

Com a Lei também foi instituído o dia Nacional da Consciência Negra (20 de novembro), em homenagem ao dia da morte do líder quilombola negro Zumbi dos Palmares. O dia da consciência negra é marcado pela luta contra o preconceito racial no Brasil. Sendo assim, como trabalhar com essa temática em sala de aula? Os livros didáticos já estão quase todos adaptados com o conteúdo da Lei 10.639/03, mas, como as ferramentas que os professores podem utilizar em sala de aula são múltiplas, podemos recorrer às iconografias (imagens), como pinturas, fotografias e produções cinematográficas.

Apesar do período em vigor, ainda está longe de ser realidade e enfrenta uma série de desafios para ser posta em prática, segundo especialistas na área. Educadores e historiadores ouvidos pelo g1 destacam a importância do tema ser debatido em sala de aula como forma de combater o racismo, valorizar a diversidade e reconhecer a contribuição e o papel fundamentais do povo negro na construção da nossa sociedade. Eles ressaltam, porém, que, em geral, o assunto é tratado nas escolas, quando é tratado com superficialidade, estereótipos e materiais desatualizados. Também relatam falta de apoio na formação dos professores.

Mas, afinal, o que diz a Lei? A lei 10.639 tem o objetivo de resgatar "a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil". Ela especifica os temas que devem ser abordados obrigatoriamente em sala de aula, incluindo: História da África e dos africanos; A luta dos negros no Brasil; A cultura negra brasileira; e o negro na formação da sociedade nacional. Esses conteúdos devem ser dados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras.

A lei modificou a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) da Educação Nacional, que define os conteúdos obrigatórios que devem ser desenvolvidos pelas escolas - tanto da rede pública quanto privada. A LDB também traz orientações como a de que o ensino considerar o pluralismo de ideias, respeito à liberdade e garantia de padrão de qualidade.

Precisamos dizer e afirmar, ininterruptamente, que não existe história do Brasil sem a história afro-brasileira. Não dá para falar do país sem considerar a total e enorme influência da população negra. Os negros estiveram no Brasil na colonização, na Independência, na República, na ditadura e na redemocratização. E permanecem. Trabalhar estes assuntos em sala de aula sem reforçar isso pode levar ao erro de reduzir a presença negra apenas a situações diretamente ligadas à escravidão ou de extrema marginalização. Não há história e história afro-brasileira. A história é uma só. Cultura é uma só.

Valdir Barranco (deputado estadual pelo terceiro mandato e presidente do PT-MT)

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